sexta-feira, 30 de março de 2018

O que é Ética Cristã

INTRODUÇÃO
Falar de ética cristã não é fácil, nem tão simples quanto gostaríamos. O assunto é vasto, dialoga com muitas áreas do saber, e demanda muita pesquisa por parte do ensinador da Palavra de Deus. Só na obra Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia, do Dr. Russel Norman Champlin (ed. Hagnos), a conceituação do verbete ÉTICA (em suas diversas ramificações) ocupa quase 34 longas páginas! Há fortes e variadas implicações filosóficas e teológicas na abordagem deste assunto, mas as nossas aulas dominicais exigem que sejamos menos técnicos e prolixos, e mais práticos e concisos na abordagem desse assunto, para que não imponhamos prejuízo ao entendimento de nossos alunos, cuja formação secular e bíblica é tão variada. Discussões mais técnicas deixamos para ambientes de ensino técnico, como as faculdades ou seminários.
Não podemos também nos esquecer que precisamos falar de ética numa perspectiva cristã, objetivando alcançar não apenas a mente de nossos alunos, transmitindo informação e promovendo discussão, mas, muito mais que isso, levarmos nossos alunos à reflexão, e à uma tomada de postura ética que seja bíblica e cristã no enfrentamento da inversão de valores morais como percebemos na sociedade em que vivemos. Como dizia o pedagogo Howard Hendricks, “ensinando para transformar vidas”! Bom trimestre e boa aula!
Antes de prosseguirmos, gostaria de te apresentar um conteúdo que pode lhe ajudar a melhorar suas aulas na Escola Bíblica Dominical. O curso produzido pela Universidade da Bíblia chama-se Formação de Professores para Escola Bíblica Dominical e tem matérias sobre a psicologia da educação cristã, didática, métodos de ensino entre outros. Clique aqui e saiba mais!

I. CONCEITO DE ÉTICA CRISTÃ

O pastor e teólogo assembleiano Claudionor de Andrade, em seu livro As novas fronteiras da Ética Cristã (CPAD), apresenta-nos dois conceitos básicos de ética:
1. Ética (secular)“conjunto de normas e preceitos valorativos, cuja missão é orientar o indivíduo, em particular, e a sociedade, como um todo, a trabalhar pelo bem comum” (1). Andrade faz, contudo, a ressalva de que “no âmbito das academias, porém, a ética adquire algumas conotações bastante deletérias”. Entretanto, para fins pedagógicos, nos contentaremos com o conceito apresentado acima, apenas acrescentando o étimo da palavra ética: no grego, ética é “ethos”, que significa “costume”, “disposição”, “hábito”. Assim, o Dicionário de Filosofia de Nicola Abbagnano define ética com brevidade: a ciência da conduta (2).
Como é impossível falar de ética e não falar de moral, visto que ambos os conceitos são intimamente correlatos, precisamos aqui também conceituar moral. Moral, do latim morales, refere-se, segundo o comentarista da nossa Lição, o Dr. Douglas Baptista, “ao comportamento das pessoas e às reações dos indivíduos que compõem uma sociedade em relação às regras estabelecidas pela ética” (3). Poderíamos dizer que Ética (com inicial maiúscula) é a ciência que estuda o comportamento humano ideal; ética (com inicial minúscula) corresponde ao próprio comportamento ideal em sociedade; e moral corresponde à reação individual de cada membro da sociedade em relação ao que está como padrão ideal. Os que seguem os valores éticos da sociedade são considerados sujeitos morais, ao passo que aqueles que vivem de modo transgressor aos padrões éticos são chamados de imorais.
2. Ética cristã“é a ciência que tem por objetivo orientar não apenas o cristão, mas também o não cristão, quanto às reivindicações da Bíblia Sagrada acerca de sua conduta pessoal, familiar e publicar” (4). Champlin diz que “A ética cristã normal e ortodoxa é uma forma de ética absoluta”, cujo pressuposto básico “é que os princípios morais alicerçam-se sobre padrões imutáveis, que não se alteram em face de situações ou de indivíduos” (5). Mas os valores absolutos da ética cristã são absolutos porque repousam sobre a revelação de Deus nas Escrituras Sagradas. “Portanto, a ética cristã não se modifica e nem se relativiza. Desse modo, a ética cristã não pode ser desassociada da moral e dos bons costumes preconizados nas doutrinas bíblicas”, conclui o comentarista Douglas Baptista (6). A ética cristã, portanto, é sujeita às doutrinas bíblicas, jamais o inverso. O decano da educação cristã no Brasil, Pr. Antônio Gilberto, é incisivo: “A doutrina bíblica gera bons costumes, mas bons costumes não geram boa doutrina. Igrejas há que têm um somatório imenso de bons costumes, mas quase nada de doutrina. Seus membros naufragam com facilidade por não terem o lastro espiritual da Palavra” (7).
Concluo este tópico com três princípios elementares da ética cristã:
Primeiro, a ética cristã é UNIVERSAL, ou seja, os valores que ela apregoa são válidos para todos os homens em todo mundo; segundo, a ética cristã é SUPRACULTURAL, isto é, está acima das culturas locais, podendo até mesmo ajustá-las ou transformá-las, para que elas se adequem aos valores cristãos (por exemplo, culturas onde a idolatria, poligamia, pedofilia ou violência contra a mulher são praticados e algumas vezes até reconhecidos e assegurados por políticas ou costumes locais); por último, a ética cristã é ATEMPORAL, ou seja, não tem prazo de validade. Aquilo que o Evangelho apresenta como regra de fé e prática deve ser obedecido em todo mundo e em todo tempo. A ética cristã traz os marcos antigos que não podem ser removidos! (Pv 22.28; 2Ts 3.6)

II. FUNDAMENTOS DA ÉTICA CRISTÃ

Como já dissemos no primeiro tópico, o principal fundamento da ética cristã é a Palavra de Deus, a Bíblia sagrada. Neste sentido, é preciso considerar que a Bíblia é a Palavra inspirada, inerrante e infalível de Deus! Romper com estes pressupostos – como fizeram os teólogos liberais e/ou ecumênicos – é romper também a noção dos valores absolutos esposados na Bíblia Sagrada. Ou seja, recusar que a Bíblia é a Palavra de Deus inerrante é recusar que ela tenha a última palavra em matéria de conduta moral para o ser humano. Mas a Bíblia é a nossa regra de fé e prática – Sola Scriptura!
Como está bem colocado no corpo da nossa Lição (CPAD), os fundamentos bíblicos da ética cristã perpassam desde o Decálogo (Os Dez Mandamentos), pelo sermão do monte de Jesus, pelos ensinos paulinos, até as epístolas gerais do Novo Testamento. Visto que a Bíblia nos revela o caráter de Deus e conclama-nos a imitá-lo (Ef 5.1), precisamos voltar-nos para as páginas do livro sagrado se quisermos saber que maneira de proceder é adequada ou não ao cristão. A Bíblia é o nosso ponto de referência para distinguirmos o certo e o errado! O que convém e o que não convém! (1Co 10.23) E assim separarmos o santo do profano (Lv 10.10). Alan Pallister destaca: “uma ética fundamentada na Lei de Deus e no ensino de Cristo é manifestamente uma opção melhor e mais racional, do que uma ética que pretende se fundamentar no iluminismo ou em filosofias mais recentes” (8).
Agora, como bem salienta o pastor Claudionor de Andrade, embora a Bíblia tenha a supremacia em matéria de ética cristã, não descartamos um apoio secundário em outras fontes legítimas. Andrade destaca, além da Bíblia, o papel da tradição eclesiástica, das leis humanas e dos bons costumes, sendo que todas estas outras fontes de conhecimento e orientação só estão legitimadas enquanto em consonância com a Palavra de Deus. Sobretudo por razões apologéticas, ou seja, na defesa da fé e dos valores cristãos, precisamos nos munir de múltiplos conhecimentos para darmos a razão de nossa fé aos que nos inquirirem sobre questões éticas. Andrade explica:
“Não basta dizer, por exemplo, que o aborto é uma prática condenável. É necessário que nos especializemos no assunto, visando conhecer-lhe todas as implicações. Dessa forma, teremos um firme embasamento para justificar as demandas da Palavra de Deus quanto à santidade da vida humana. (…) Se não formos razoáveis e lógicos, jamais seremos ouvidos por um mundo relativizado, incrédulo, exigente e inamistoso” (9).
Assim sendo, é bom que sejamos tradicionais sem ser tradicionalistas; legais sem ser legalistas. Tanto a tradição da igreja histórica, especialmente via Credos religiosos, como as leis seculares, especialmente naquilo que pretende assegurar o direito e a proteção aos bons costumes, podem ser apoios para o cristão explicar e aplicar os valores da Palavra de Deus em nossos dias. Há muitos questionamentos feitos pelo homem moderno cujas respostas não estão dadas direta e objetivamente na Bíblia, mas a partir do bom senso e de uma apreciação razoável da opinião de homens e mulheres de Deus que viveram no passado além de um profundo conhecimento das leis e dos costumes de um povo, podemos apresentar soluções adequadas aos dilemas da sociedade. Por exemplo, a Bíblia não diz nada sobre pesquisa com células tronco, nem sobre pleitos eleitorais, nem sobre ideologia de gênero ou sobre o consumo de drogas. Mas certamente o conhecimento dos princípios e doutrinas bíblicas, aliado a uma leitura profunda destas demandas da sociedade em nosso tempo, poderão munir o cristão para “responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós” (1Pe 3.15).

III. CHAMADOS A VIVER ETICAMENTE

Nossa primeira Lição deste trimestre tem como texto bíblico de base os versículos 1 a 13 do décimo capítulo da primeira carta de Paulo aos Coríntios. Neste trecho bíblico, o apóstolo Paulo ressalta a morte de milhares de judeus no deserto durante a fuga do Egito em virtude dos muitos pecados praticados de modo contumaz por aquela geração incorrigível. Paulo destaca os seguintes pecados: cobiça (v.6), idolatria (v. 7), prostituição (v. 8), tentar a Cristo (v. 9), e murmuração (v. 10). O que merece destaque é que aquela trágica experiência da geração desobediente de Israel está posta para nós “em figura” (v. 6),  ou “como figuras, e estão escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos” (v. 11). Ou seja, o que Israel padeceu por não viver a ética estabelecida por Deus é um aviso de Deus para nós hoje que, a exemplo deles, padeceremos se não atentarmos para os valores do Reino de Deus.
  1. Cobiça – A ética cristã ao mesmo tempo em que reprova a cobiça às posses alheias (Ex 20.17; Rm 13.9), também defende a proteção ao bem alheio (Dt 19.14); ao mesmo tempo em que condena a cobiça do que é mau, ordena a busca do que é bom (3Jo 11).
  2. Idolatria – A ética cristã não suporta a visão religiosa pluralista, nem pactua com o ecumenismo. A teoria de que “tudo é Deus” (panteísmo), “todos os caminhos levam a Deus” (politeísmo) ou que “somos todos irmãos” (ecumenismo) deve ser rechaçada, visto que somente Deus é digno de ser adorado, e que Jesus Cristo é o caminho, a verdade e a vida, excluindo qualquer possibilidade do homem chegar-se a Deus por outros meios (Jo 14.6; At 4.12). Idolatria foi um dos pecados mais recorrentes no antigo Israel, e a razão de muitas vezes ter sido punido por Deus, inclusive com o exílio e e constantes invasões estrangeiras.
  3. Prostituição – A ética cristã é inimiga das relações sexuais libertinas, que não se limitam ao leito conjugal que deve ser honrado. “Os que se dão a prostituição, Deus os julgará” (Hb 13.4). Visto que vivemos dias semelhantes aos de Noé e de Ló (Lc 17.26-28), em que os clamores pela liberação sexual se multiplicam em toda terra, e práticas perversas têm sido cada vez mais frequentes (bestialismo, homossexualismo, pedofilia, etc.), a igreja precisa erguer a voz e levantar a bandeira dos bons costumes judaico-cristãos: virgindade até o casamento, pureza entre solteiros, respeito ao corpo como templo e morada do Espírito, casamento heterossexual e monogâmico. A Igreja deve ser o sal que preserva da corrupção e traz o bom sabor, e também deve ser a luz que dissipa as trevas da imoralidade! (Mt 5.13,14)
  4. Tentar a Cristo – O que significa tentar a Deus ou tentar a Cristo? O Dr. Anthony D’Palma responde com clareza: “‘Tentar o Senhor’ é experimentar até que ponto se pode abusar da paciência de Deus antes de incorrer em seu julgamento (Dt 6.16)” (10). Abusar da paciência de Deus revela uma falta de temor no coração do homem, mas a ética cristã é justamente pautada pelo temor e a reverência a Deus! Logo, são imorais aqueles que vivem tentando ao Senhor com seus pecados reiterados e a obstinação do coração.
  5. Murmuração – Como pontua o pastor Douglas Baptista, “o significado [de murmuração] aqui se refere à falta de ética que provoca maledicência, inveja e calúnias contra o próximo, e ainda provoca a ira de Deus” (11). A ética cristã rege que sejamos agradecidos a Deus em toda e qualquer situação (Cl 3.15; 1Ts 5.18), e que não falemos mal de nosso próximo (Tg 4.11). Logo, mal utilizar a língua para “incendiar um bosque” (Tg 3.5) é ferir ao mesmo tempo os dois mandamentos em que se resume toda a Lei: amar a Deus e ao próximo (Lc 10.27). Que nossas palavras sejam sempre agradáveis, nunca usando de ira e maldizer, dando glórias a Deus em toda situação e comunicando palavras de vida aos que nos ouvirem (Sl 19.14; Cl 4.6).

CONCLUSÃO

Estou plenamente convicto de que os conceitos introdutórios sobre ética cristã trabalhados aqui serão ampliados ao longo do trimestre. A Igreja do Senhor precisa se preparar para defender com mansidão e sabedoria os bons valores que a sociedade tem negociado e perdido ao longo dos séculos. O cantor Victorino Silva em uma de suas belíssimas canções, diz: “Parece que o pecar não é pecado mais, parece que o errar não é errado mais, parece tão comum pedir mais um perdão, parece que o temor não há nos corações”. Este hino “Consequências” é um fiel retrato da perca da ética cristã em muitos círculos evangélicos. Que lamentável! “Antes que a lâmpada se apague” (1Sm 3.3) precisamos resgatar e sustentar os bons valores como um antigo soldado que devia segurar e utilizar bem sua espada em meio à guerra. Sim, este trimestre estamos convocados pelo General dos Exércitos a “manejar bem a Palavra da verdade” (2Tm 2.15) na defesa dos valores imutáveis e dos bons costumes declarados no Evangelho. E isso faremos ao longo deste trimestre, se Deus assim nos permitir!

Gospel Prime

sexta-feira, 16 de março de 2018

Você está vivendo ou só gastando tempo de vida?

A nossa vivência em sociedade, em todas as épocas, sempre nos levou a buscar o sucesso. Só que, assim como em todas as épocas, buscamos e/ou conquistamos sucesso com uma ou mais motivações.
Mas ter motivação para a conquista do sucesso não é, per si, causa excelente para nos garantir a realização, pois, às vezes, buscamos o sucesso com uma ou mais motivações erradas, e será no momento em que conquistarmos tal sucesso que perceberemos que não estamos realizados e chegaremos à conclusão de que tudo que fizemos foi não viver e sim gastar de tempo de vida.
Uma pessoa que busca o sucesso para provar a alguém que ela não é o tipo de pessoa insignificante que tal pessoa julgou ser ela, está fadada a enfrentar pelo menos três tipos de situações, quais sejam: 1. De superar os desafios requeridos para alcançar o sucesso que busca; 2. De tentar fazer com que seu desafeto “engula” seu orgulho e a aplauda em seu sucesso; 3. De, provavelmente, se frustrar pelo fato de ter buscado uma conquista que, embora lhe traga o sucesso, não lhe proporcionará realização.

A vida é coisa séria

Como está provado, viver não é tão fácil, pois podemos facilmente nos permitir não viver por toda uma vida, ou parte dela, e, assim, ter de encarar a frustração de não termos verificado o que nos motivou ou motiva a buscar o que buscamos e a fazer o que fazemos.
Embora eu não seja adepto do busdismo, concordo com o que disse o pensador budista Lao-Tsé que escreveu que “uma longa viagem começa com um único passo”. Mas na vida não é tão simples assim. Antes de iniciarmos uma caminhada rumo à conquista de algo, devemos nos questionar sobre nossa motivação para tal até que todas as máscaras ilusórias tenham sido retiradas, pois, se percorrermos um caminho que não nos fará bem à alma no final, teremos feito uma longa e vã caminhada.

Risco

A única pessoa a quem você precisa provar algo é à você mesmo, pois, do contrário, vais se colocar como que em um julgamento onde as provas e contraprovas vão debilitar sua alma e esmigalhar suas emoções te tornando alguém facilmente suscetível à depressão, à ansiedade, baixo-estima pessoal e à todas as demais doenças que podem afetar a uma alma que não tem robustez existencial.
Perguntas
O que está te motivando a fazer tudo o que você tem feito? Você, de fato, está vivendo ou só gastando tempo de vida?

GOSPEL PRIME

sexta-feira, 9 de março de 2018

Dádivas, privilégios e responsabilidades na Nova Aliança

Quer se tornar um Professor e Líder da Escola Bíblica altamente Capacitado e Comprometido com o Ensino Bíblico!?
Conheça a Formação de Professores e Líderes para Escola Bíblica Dominical (EBD).


INTRODUÇÃO
Hoje daremos continuidade e também findaremos o ciclo de estudos na carta aos Hebreus que compara a antiga com a nova aliança. Agora, entretanto, desenvolveremos nosso estudo sobre o tripé: dádiva, privilégio e responsabilidade. Nosso capítulo em estudo é o décimo capítulo de Hebreus, o qual alunos e professores devem mastigar bem antes da aula dominical. Bom estudo!

I. A DÁDIVA DA NOVA ALIANÇA

O evangelista Jimmy Swaggart diz que foram aproximadamente um bilhão de animais sacrificados no Antigo Testamento até os dias de Cristo. Não parece um número escandaloso, pois como cita o comentarista da Lição, José Gonçalves, “especialistas em cultura judaica, e na língua hebraica, afirmam que houve situações nas quais os filhos de Arão se gabavam de ficar cobertos de sangue sacrificial até os tornozelos”. Entretanto, o que afirma o autor da carta aos Hebreus é que “é impossível que sangue de touros e dos bodes tire pecados” (Hb 10.4). Aqueles sacrifícios da antiga aliança não eram capazes em si mesmos de expiar a culpa dos pecadores, mas eram recebidos por Deus, dentro das condições por Ele estabelecidas, somente porque eram “a sombra dos bens futuros” (Hb 10.1), ou seja, apontavam para o sacrifício perfeito e que tem poder nele mesmo de purificar os pecadores: o sacrifício de Jesus Cristo. Ele é “o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”! (Jo 1.29) E o sacrifício de Cristo, diz João, nos purifica de todo pecado (1Jo 1.7), e é suficiente para propiciação dos pecados de “todo o mundo” (1Jo 2.2).
Agora veja: um bilhão de animais sacrificados em tempos outrora não podiam purificar um só homem na Antiga Aliança, enquanto que o sacrifício de um só homem é poderoso para purificar 8 bilhões de habitantes no planeta terra hoje! Gosto do que dizia a matriarca do movimento metodista, a mulher por trás da mente disciplinada e profícua do jovem avivalista John Wesley, a sua mãe, Susanna Wesley (séc. 18). Susanna dizia que os méritos da morte de Cristo não são esgotados por aqueles que são salvos, mas “se houvesse tantos mundos para salvar quanto a onipotência pudesse criar, um único sacrifício de si mesmo seria suficiente para salvar todos” (1). Claro, não sou adepto da teoria do multiverso (muitos universos), mas ainda que houvesse outros mundos, de fato, o único sacrifício de Cristo seria capaz de alcançar todos pecadores onde quer que eles estivessem! Estavam certos os nossos irmãos que diziam: “o sangue de Jesus tem poder”. De fato, tem poder, e é imensurável!

II. OS PRIVILÉGIOS DA NOVA ALIANÇA

Embora sejam muitos os privilégios da nova aliança da qual Cristo é mediador, para fins didáticos, a nossa Lição destaca três privilégios: regeneração, adoração e comunhão.
1. Regeneração – como sendo uma obra interior operada pelo Espírito Santo ao tornar a criatura degenerada pelo pecado em uma criatura regenerada pelo sangue de Cristo. E tome nota disto ainda: pelo sangue de Cristo não só o pecador que crê é regenerado ou renovado, mas também a Criação, maculada pelo pecado do homem (Gn 3.17,18), será renovada para o maravilhoso reino milenar de Cristo – a regeneração universal (Ap 21-22; Rm 8.19-23).
2. Adoração – como um caminho agora aberto, sem mediadores, diretamente para Deus, pelo qual os regenerados, ou santificados pelo sangue de Cristo, podem oferecer orações, louvor e serviço para Deus, sem receio no coração já que foram “purificados da má consciência” (10.22). Óbvio que o véu rasgado e o novo e vivo caminho agora aberto para Deus não implica em que os adoradores estão liberados para adorarem como bem entenderem, nem que a reverência e o temor a Deus deva dar lugar à irreverência e desordem, como é possível constatar em muitas igrejas que já perderam o senso de reverência em nome de um evangelismo popular ao gosto do freguês, alguns até abusando de gírias e extravagâncias na música, na pregação ou na organização de um lugar para o culto público (alguns cultos há que se parecem mais um festival de dança, outros se parecem com um um circo, outros uma boate. Pasmem!). O caminho está aberto para todos os salvos, e pelo sangue de Cristo o Pai nos recebe sem ira; todavia, o Pai continua sendo santo e exige santidade daqueles que se aproximam dele para cultuá-lo (Jo 4.23,24). O autor de Hebreus afirma claramente: “…adoremos a Deus de modo aceitável, com reverência e temor, pois o nosso ‘Deus é fogo consumidor’” (Hb 12.28,29, NVI).
3. Comunhão – com um novo povo, não mais por cumprimento de rituais externos impostos pela Lei, mas pela fé do coração e a santificação pelo sangue de Jesus. Este povo é a IGREJA, não mencionada explicita e diretamente na Antiga Aliança, mas fundada por Jesus Cristo no dia de Pentecostes, quando o Pai derramou o seu Espírito para constituir um novo povo que não estaria restrito por barreiras étnicas ou sociais, nem por limitação geográfica, e que receberia de Deus o poder e a vocação para anunciar as maravilhas do Senhor a todo o mundo – já que Israel falhou em cumprir sua vocação missionária na Antiga Aliança. “Eu edificarei a minha igreja”, disse Jesus (Mt 16.18), e após o derramamento do Espírito em Atos 2, já vemos esta igreja inaugurada, onde os irmãos em Cristo “todos os dias, continuavam a reunir-se no pátio do templo. Partiam o pão em suas casas, e juntos participavam das refeições, com alegria e sinceridade de coração, louvando a Deus e tendo a simpatia de todo o povo. E o Senhor lhes acrescentava todos os dias os que iam sendo salvos” (At 2.46,47).
Embora vivamos dias de desigrejamento, onde se multiplica o número de membros pretendendo viver fora do corpo e como ovelhas sem pastor, o modelo da igreja primitiva é contrário a teoria dos desigrejados! Como vimos no texto de Atos supracitado, os irmãos “continuavam a reunir-se”. Jesus disse que “onde se reunirem dois ou três em meu nome, ali eu estou no meio deles” (Mt 18.20). As cartas do Apocalipse não foram enviadas a membros desigrejados, nem à pastores sem igreja, mas à pastores com igrejas que precisavam de correção ou consolo e que deviam ser instruídas por eles conforme as orientações de Cristo. O autor da carta aos Hebreus exorta: “Não deixemos de reunir-nos como igreja, como é o costume de alguns, mas procuremos encorajar-nos uns aos outros, ainda mais quando vocês veem que se aproxima o Dia” (Hb 10.25, NVI). Grave isto: a Igreja não “sou eu”. Eu sou membro do corpo. A Igreja “somos nós”, pois nós somos o corpo (“um só corpo” – Ef 4.4), do qual Cristo é o cabeça! Devemos considerar um grande privilégio fazer parte do corpo de Cristo, “ajustado e unido pelo auxílio de todas as juntas” (Ef 4.16). Como dizia um antigo corinho:

Como é precioso, irmão, está bem junto a ti,

E juntos, lado a lado, andarmos com Jesus,

E expressarmos o amor que um dia Ele nos deu,

Pelo sangue do Calvário sua vida trouxe a nós

III. RESPONSABILIDADES DA NOVA ALIANÇA

– O conceito de aliança implica responsabilidade
Creio que aqui é o momento mais que oportuno para definir o conceito de aliança, nos termos teológicos como estamos tomando por todo este trimestre. A origem da palavra “aliança” é a mesma de “acordo” ou “testamento”, e segundo o Dicionário Ilustrado da Bíblia, aliança é um “acordo entre duas pessoas ou dois grupos envolvendo promessas de ambas as partes”, todavia, com uma ressalva: “implica em muito mais do que um mero contrato ou acordo (…), mas uma aliança que abrange todo o ser do indivíduo” (2). Ou seja, na aliança firmada entre Deus e os homens, há promessas e responsabilidades de ambas as partes, mas não só um compromisso de palavras ou troca de favores (se assim podemos dizer), mas o próprio ser, a própria integridade, o próprio caráter, a própria essência de Deus e dos homens estão envolvidos no pacto.
Jesus disse que a quem muito é dado, muito será cobrado, e a quem muito se confiou, muito mais se lhe pedirá (Lc 12.48). Não nos foram dadas promessas maiores na Nova Aliança do que aos judeus na Antiga Aliança? Já vimos ao longo deste trimestre que sim, a Nova Aliança traz promessas superiores. Sendo assim, como bem diz Paulo aos gentios de Roma, “não se orgulhe, mas tema” (Rm 11.20). Tão grande é a responsabilidade do crente na Nova Aliança que o autor de Hebreus diz em demoradas palavras:
“Porque, se pecarmos voluntariamente, depois de termos recebido o conhecimento da verdade, já não resta mais sacrifício pelos pecados, Mas uma certa expectação horrível de juízo, e ardor de fogo, que há de devorar os adversários. Quebrantando alguém a lei de Moisés, morre sem misericórdia, só pela palavra de duas ou três testemunhas. De quanto maior castigo cuidais vós será julgado merecedor aquele que pisar o Filho de Deus, e tiver por profano o sangue da aliança com que foi santificado, e fizer agravo ao Espírito da graça? Porque bem conhecemos aquele que disse: Minha é a vingança, eu darei a recompensa, diz o Senhor. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo” (Hb 10.26-30).
E então o autor conclui:
“Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo” (v. 31)
Desde que cumpramos nossa parte no acordo, Deus está disposto – e é poderoso – a levar-nos muito mais longe do que levou os antigos patriarcas e profetas. Todavia, que Deus ache em nós o que achou em Noé: prontidão e retidão; o que achou em Abraão: fé e obediência; o que achou em Moisés: renúncia e fidelidade; o que achou em Davi: paixão e quebrantamento; o que achou em Pedro: ousadia e arrependimento; o que achou em Paulo: serviço e perseverança.
– Não existe salvação incondicional nem segurança incondicional para o crente
Nem a salvação é incondicional, nem as recompensas são incondicionais. Tudo tem uma condição, e resume-se em pelo menos três pontos no décimo capítulo de Hebreus:
  • Vigilância, para não deixar-se apartar do Deus vivo seduzido pelo mundo ou pelos enganos das heresias
  • Confiança, para aproximar-se de Deus (na Palavra e na oração)
  • Perseverança, para não recuar da fé outrora abraçada – o que seria trágico para o crente! Aliás, no décimo capítulo de Hebreus novamente encontramos ao mesmo tempo uma grandiosa promessa quanto uma contundente advertência e que devem ser levadas a sério pelo leitor das Escrituras: “Por isso, não abram mão da confiança que vocês têm; ela será ricamente recompensada. Vocês precisam perseverar, de modo que, quando tiverem feito a vontade de Deus, recebam o que ele prometeu; pois em breve, muito em breve ‘Aquele que vem virá, e não demorará. Mas o meu justo viverá pela fé. E, se retroceder, não me agradarei dele’” (vv.35-38). Embora Teodoro de Beza (1519-1605), sucessor de João Calvino em Genebra, tenha modificado sem amparo exegético a última parte deste texto de Hebreus em sua tradução, para retirar do texto bíblico a clara possibilidade do justo vir a recuar da fé e não encontrar o prazer do Senhor (Beza como bom calvinista não admitia esta possibilidade) (3), fato é que é exatamente isso que o texto está dizendo: o justo precisa perseverar, mas há a possibilidade de ele, este mesmo justo (o que foi justificado por Cristo!) vir a deixar de perseverar. A consequência nesse caso já está anunciada pelo próprio Deus: “não me agradarei dele” (NVI) ou “a minha alma não tem prazer nele” (ARC). Como bem destaca José Gonçalves no próprio comentário da Lição, “Não há dúvida de que ele [o autor de Hebreus] acreditava que um cristão genuíno pode decair da graça, senão, não teria sentido algum seu duro tom exortativo”. Aliás, sem véu, sem sombras, sem figuras, o autor de Hebreus diz com clareza, como que sob a luz do sol ao meio dia: “Cuidem que ninguém se exclua da graça de Deus…” (12.15, NVI). Deus não brinca nem faz advertências inúteis. No caminho para o céu há muitas placas sinalizadoras; ignorá-las ou atenuar o perigo de suas advertências poderá custar um preço caríssimo aos viajantes!
CONCLUSÃO
Com a Lição de hoje encerramos um ciclo de estudos sobre a antiga e a nova aliança na Carta aos Hebreus. Nossa confiança é que mesmo que alguns assuntos tenham sido repetidos nestas últimas Lições, tal repetição foi não só exegeticamente justificada, como também pedagogicamente necessária para fixar o assunto em nossas mentes. Assunto que, diga-se de passagem, não é tão simples quanto podia parecer a uma primeira vista: o sacerdócio de Cristo. O próprio autor de Hebreus admitiu que este era um assunto difícil (Hb 5.11). A repetição ajuda na compreensão. Se fosse Paulo ele diria: “Escrever-lhes de novo as mesmas coisas não é cansativo para mim e é uma segurança para vocês” (Fp 3.1). Sejamos agradecidos a Deus por todas as bênçãos que Ele já tem derramado sobre nós e por tantas quantas ainda nos dará, e já que não podemos pagar por todas estas dádivas, “por meio de Jesus, ofereçamos continuamente a Deus um sacrifício de louvor, que é fruto de lábios que confessam o seu nome” (Hb 13.15).
____________
REFERÊNCIAS
(1) Ronald Gripp Donato. Susanna Wesley e sua influência na vida de John Wesley, Reflexão, p. 123
(2) Ronald F. Youngblood (ed.). Dicionário Ilustrado da Bíblia, Vida Nova, pp. 43,4
(3) Para ler sobre a alteração textual feita por Beza, leia este post que publiquei em minha página no Facebook: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1091005037700557&set=a.113215372146200.15002.100003732127838&type=3&theater. Além do teólogo Robert Shank, que eu cito no post, o teólogo wesleyano Orton Wiley aponta ao menos outra mudança textual também feita pelo calvinista Teodoro de Beza em sua tradução de Hebreus, numa tentativa forçada de adequar o texto à sua teologia perseveracionista. Uma violência ao texto! Consulte A excelência da Nova Aliança em Cristo: comentário exaustivo da carta aos hebreus, Central Gospel, p. 293.

sexta-feira, 2 de março de 2018

O cristão como agente de transformação do Brasil

Todo processo de transformação envolve mudar, adequar, modelar algo para uma forma mais apropriada, mais produtiva, mais qualificada, melhor. Nesse processo, os agentes somos sempre nós e o instrumento transformador é o nosso trabalho, que expressa nossas habilidades, conhecimentos e experiência.
A transformação do Brasil em todas as áreas da sociedade passa, portanto, pela adoção de uma perspectiva de Deus sobre as profissões e o trabalho. Assim como Deus se revelou por meio da Sua criação, trabalho de suas mãos, nós O revelamos a partir de nosso trabalho, das atividades diárias que desempenhamos profissionalmente.

Deus nos criou para executar uma parte específica e fundamental de Seu plano: fomos criados para cuidar do Seu mundo material e para formar nações com base nas Suas leis e promessas (Gn. 1:28). Fomos criados para revelá-LO pelos talentos, dons, capacidades e conhecimentos que Ele nos dá (Mt. 5: 13-16). A alguns de nós, Deus capacitou na área econômica, dos negócios, para revelá-LO enquanto Jeová Jiré: Deus Provedor. Outros, Ele chamou para a área de artes para revelá-LO enquanto Deus da Beleza. Outros ainda foram capacitados para lutar por Justiça na área do direito, da política, ou ainda para disseminar o Deus da Verdade, por meio das comunicações e da educação. Todos fomos chamados para revelá-LO de uma forma particular pelo trabalho de nossas mãos, seja dentro seja fora da instituição Igreja.

Cristóvão Colombo, Katharina von Bora, Johannes Kepler, Isaac Newton, Galileu, John Wesley, Adam Smith, Max Weber, entre tantos outros homens e mulheres cristãos mundialmente conhecidos, exerceram suas profissões – e se notabilizaram por isso –, focados em revelar a Deus. Em seu diário, Colombo afirmou ter sido Deus a colocar em sua mente a missão de navegar para as Índias. Kepler escreveu em 1598 que os astrônomos seriam os sacerdotes de Deus quanto ao “livro da natureza” e que deveriam buscar não a glória do seu intelecto, mas acima de tudo a de Deus. Semelhantemente, Isaac Newton considerava a ciência um “jardim” que lhe fora dado para cultivar e acreditava que cada descoberta era comunicada pelo próprio Deus. Adam Smith, por sua vez, construiu uma teoria econômica com base nos princípios bíblicos: o governo deveria limitar suas atividades para administrar a justiça, fazer valer os direitos de propriedade privada e defender a nação contra a agressão.
Mais recentemente, William Wilberforce, Martin Luther King e Clive Staple Lewis (C. S. Lewis) revelaram Deus por meio de seu trabalho. Wilberforce, um político britânico, liderou o movimento abolicionista do tráfico negreiro, que se disseminou por todo o mundo a partir do século XIX.  Martin Luther King lutou contra a discriminação racial e foi um dos mais importantes líderes de movimentos pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos em meados do último século. Por fim, C. S. Lewis, professor universitário e escritor, utilizou seu talento e seus conhecimentos literários para traduzir e disseminar a mensagem do Evangelho em ficções científico-religiosas, conhecidas em todo o mundo.
Assim como eles, nós também podemos e somos chamados a ser os agentes de Deus para transformar nossa Nação. Há um tempo, porém, parte expressiva da Igreja cristã perdeu essa perspectiva sobre o trabalho fora da instituição Igreja (“Teologia do laicato”). Como resultado, a maioria do povo de Deus tem trabalhado 5 ou 6 dias por semana para “ganhar dinheiro” e não para revelar e honrar a Deus a partir de sua profissão. Temos sido uma Igreja sem influência, que vive num mundo doente, inseguro e injusto, e pouco o tem impactado e o transformado pela cultura do Reino de Deus.
A transformação do Brasil ocorrerá e alcançará a proporção necessária e por nós almejada quando cada um de nós entender e exercer seu trabalho para revelar Deus e implantar a cultura do Reino em nossa Nação. É sendo o Reino e vivendo o Reino que testemunharemos a transformação do Brasil em uma Nação conhecida pela alegria, paz e justiça. Já temos o Manual: a Palavra de Deus revelada a nós. Resta-nos conhecê-la e praticá-la em relação a todas as áreas da sociedade.

Gospel Prime